QUARESMA O nosso testemunho de pobreza
QUARESMA
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O
nosso testemunho de pobreza
Em cada época e lugar, Deus continua a
salvar os homens e o mundo por meio da pobreza de Cristo,
que Se faz pobre nos Sacramentos, na Palavra e na sua Igreja, que é um povo de
pobres.
À imitação do nosso Mestre, nós,
cristãos, somos chamados a ver as misérias dos irmãos, a tocá-las, a ocupar-nos
delas e a trabalhar concretamente para as aliviar. A miséria não coincide com a pobreza;
a miséria é a pobreza sem confiança, sem solidariedade, sem esperança. Podemos
distinguir três tipos de miséria A miséria material é a que habitualmente designamos por
pobreza e atinge todos aqueles que vivem numa condição indigna da pessoa
humana: privados dos direitos fundamentais e dos bens de primeira necessidade
como o alimento, a água, as condições higiénicas, o trabalho, a possibilidade
de progresso e de crescimento cultural. Perante esta miséria, a Igreja oferece
o seu serviço, a sua diakonia, para ir ao
encontro das necessidades e curar estas chagas que deturpam o rosto da
humanidade. Nos pobres e nos últimos, vemos o rosto de Cristo; amando e
ajudando os pobres, amamos e servimos Cristo. O nosso compromisso orienta-se
também para fazer com que cessem no mundo as violações da dignidade humana, as
discriminações e os abusos, que, em muitos casos, estão na origem da miséria.
Quando o poder, o luxo e o dinheiro se tornam ídolos, acabam por se antepor à
exigência duma distribuição equitativa das riquezas. Portanto, é necessário que
as consciências se convertam à justiça, à igualdade, à sobriedade e à partilha.
Não menos preocupante é a miséria
moral, que consiste
em tornar-se escravo do vício e do pecado. Quantas famílias vivem na angústia,
porque algum dos seus membros – frequentemente jovem – se deixou subjugar pelo
álcool, pela droga, pelo jogo, pela pornografia! Quantas pessoas perderam o
sentido da vida; sem perspetivas de futuro, perderam a esperança! E quantas
pessoas se veem constrangidas a tal miséria por condições sociais injustas, por
falta de trabalho que as priva da dignidade de poderem trazer o pão para casa,
por falta de igualdade nos direitos à educação e à saúde. Nestes casos, a
miséria moral pode-se justamente chamar um suicídio incipiente. Esta forma de
miséria, que é causa também de ruína económica, anda sempre associada com a miséria
espiritual, que nos
atinge quando nos afastamos de Deus e recusamos o seu amor. Se julgamos não ter
necessidade de Deus, que em Cristo nos dá a mão, porque nos consideramos
autossuficientes, vamos a caminho da falência. O único que verdadeiramente
salva e liberta é Deus.
O Evangelho é o verdadeiro antídoto
contra a miséria espiritual: o cristão é chamado a levar a todo o ambiente o
anúncio libertador de que existe o perdão do mal cometido, de que Deus é maior
que o nosso pecado e nos ama gratuitamente e sempre, e de que estamos feitos
para a comunhão e a vida eterna. O Senhor convida-nos a sermos jubilosos
anunciadores desta mensagem de misericórdia e esperança. É bom experimentar a
alegria de difundir esta boa nova, partilhar o tesouro que nos foi confiado
para consolar os corações dilacerados e dar esperança a tantos irmãos e irmãs
imersos na escuridão. Trata-se de seguir e imitar Jesus, que foi ao encontro
dos pobres e dos pecadores como o pastor à procura da ovelha perdida, e fê-lo
cheio de amor. Unidos a Ele, podemos corajosamente abrir novas vias de
evangelização e promoção humana.
Possa este
tempo de Quaresma encontrar a Igreja inteira pronta e solícita para
testemunhar, a quantos vivem na miséria material, moral e espiritual, a
mensagem evangélica, que se resume no anúncio do amor do Pai misericordioso,
pronto a abraçar em Cristo toda a pessoa. E poderemos fazê-lo na medida em que
estivermos configurados com Cristo, que Se fez pobre e nos enriqueceu com a sua
pobreza. A Quaresma é um tempo propício para o despojamento; e far-nos-á bem
questionar-nos acerca do que nos podemos privar a fim de ajudar e enriquecer a
outros com a nossa pobreza. Não esqueçamos que a verdadeira pobreza dói: não
seria válido um despojamento sem esta dimensão penitencial. Desconfio da esmola
que não custa nem dói.
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