Desejo de Deus por FRANCESCO VENTORINO
«A natureza do homem é relação com o infinito», tema da próxima edição do Meeting para a amizade entre os povos, é uma afirmação do Padre Luigi Giussani. Certamente não pode ser reduzida à constatação banal de que no homem existe a exigência de um progresso rumo ao infinito, verificação que com certeza encontraria um consenso mais amplo. Trata-se, ao contrário, do reconhecimento de uma verdade dramática: o homem é constituído pela reação com o infinito, uma realidade que ele pode abraçar e amar como fonte do próprio ser, ou blasfemar como como fazia o Capaneu dantesco, contudo sem cessar de a desejar.
O homem é
constituído pelo desejo de Deus. A consciência cristã está consciente disto
graças à revelação e às experiência. Este desejo é assinatura do Criador na
natureza humana, o princípio da grandeza desta criatura em relação a todas as
outras. Trata-se da exigência do «que vale e permanece para sempre», como nos
recorda o motu próprio (cf. Porta Fidei, 10) com o qual Bento XVI proclamou o
Ano da Fé.
Um escritor
siciliano, Gesualdo Bufalino, numa espécie de autobiografia romanceada (Argo il
cieco, ovvero i sogni della memoria), representa um dos seus personagens,
Iaccarino, num momento de verdade que o vinho tinha favorecido. Tocando «o seu
débil corno de postilhão aos quatro cantos do céu», este homem interpela Deus,
blasfema e suplica: «Ei tu, vi-te, não sejas astuto, não finjas que não
existes! Deus existe, suplico-te! Existe, ordeno-te!». Embora Bufalino, até ao
fim, se declarasse agnóstico, soube exprimir como poucos, através dos seus
heróis, a exigência de que Deus exista, o desejo de conhecer a sua face.
Esta
necessidade iniludível que «obriga» o homem a permanecer na relação com o
infinito é documentada pela forma
particular que o ateísmo moderno assumiu. Ele – escreveu p Papa na Spe salvi
(n. 42) é caracterizado pelo «protesto contra Deus». Uma lamentação que que se
inspira nas injustiças do mundo e da história universal: «Um mundo, no qual
existe uma tal medida de injustiça, de sofrimento dos inocentes e de cinismo do
poder, não pode ser obra de um Deus bom. O Deus que assumisse a
responsabilidade de um mundo semelhante não seria um Deus justo e muito menos
um Deus bom. Em nome da moral, é preciso contestar este Deus». Portanto, também
quando o homem contesta Deus, expressa a exigência inextirpável de verdade e de
justiça que nasce do ser feito por Ele.
A mesma
exigência leva a reconhecer como no anúncio cristão do Verbo feito carne se
realiza de modo impensável e gratuito o que na consciência do homem às vezes
emerge como pressentimento ou profecia. Cristo morto e ressuscitado conclama
que tudo na história é redimível, que nada se perde no turbilhão dos eventos,
que se pode viver, portanto, sem nada esquecer nem renegar.
Durante a
sua recente visita pastoral a Milão, Bento XVI, após ter assistido à execução
da nona Sinfonia de Beethoven, dirigiu-se ao público do Teatro della Scala e,
ao referir-se ao sismo que atingiu duramente a Emília, com coragem corrigiu as
palavras do Hino à alegria de Schiller: «Não experimentamos de modo algum as
centelhas divinas do Elísio. Não estamos inebriados de fogo mas, ao contrário,
paralisados pela dor diante de tanta e incompreensível destruição, que ceifou
vidas humanas, que privou muitos ad própria casa e lar. Até a hipótese de que por cima do céu
estrelado deve habitar um Pai bom nos aprece discutível. O Pai bom está sozinho
acima do céu estrelado? A sua bondade não chega até nós cá em baixo? Procuramos
um Deus que não domina à distância, mas que entre na nossa vida e no nosso
sofrimento». Com efeito, só na face de Jesus crucificado se manifesta de modo
aceitável o destino do homem e da história.
A razão que
levou o Papa a proclamar um «Ano da fé» é declarada no início do seu ministério
de sucessor de Pedro: «Ressaltar com evidência cada vez mais a alegria e o
entusiasmo renovado do encontro com Cristo» (Porta fidei, 2).
Saberão os
cristãos ser hoje o lugar no qual resplandescem a alegria e o entusiasmo deste
encontro, única possibilidade de manter a relação com o infinito? É o desafio
ligado às intenções profundas deste pontificado. (em O.R. 11-18 Agosto 2012)
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