CUBA Cuba recebe de braços abertos o "diplomata" Francisco

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Cuba recebe de braços abertos o "diplomata" Francisco
Havana em festa para receber o primeiro Papa latino-americano, que foi impulsionador das negociações com EUA. Aproveitando o momento histórico, deverá tentar convencer regime a aceitar um papel mais interventivo para a Igreja.
O Papa não deverá encontrar-se com os dissidentes YAMIL LAGE/AFP

Havana recebe neste sábado o Papa Francisco, o intermediário discreto e decisivo nas negociações secretas que levaram Cuba e Estados Unidos a reatar relações diplomáticas. A recepção será calorosa, tanto do regime – que tem nele um aliado para o fim do embargo americano – como dos cubanos, a viver na expectativa das mudanças que a reaproximação a Washington criou. Nos quatro dias da viagem, antes de partir para os Estados Unidos, haverá tempo para falar de liberdade, mas também para tentar convencer o regime a aceitar uma maior intervenção da Igreja na sociedade.
Francisco será o terceiro Papa a visitar Cuba em 17 anos, depois da histórica visita inaugural de João Paulo II em 1998, marco na abertura de Havana ao mundo e numa aproximação à Igreja. Em 2012 foi a vez de Bento XVI, mas o entusiasmo com a visita papal é agora muito maior. Não só porque Francisco é o primeiro Papa latino-americano, mas também porque tem como prioridade os mais pobres e a denúncia do capitalismo selvagem.
“Ele é diferente dos outros, mais humilde. Quase se poderia dizer que é um Papa socialista! Por isso é claro que agrada às pessoas daqui”, disse à Reuters Juan de la Torre, um cubano que vai assistir domingo à missa que Francisco celebrará na Praça da Revolução, perante centenas de milhares de pessoas e frente ao memorial de Che Guevara, seu compatriota argentino. Entre eles estará também o Presidente cubano, Raul Castro, o mesmo que saiu de um recente encontro no Vaticano a dizer que se Francisco se mantiver firme na sua mensagem “vai voltar a rezar e a ir à missa”.
Para assinalar a viagem, o regime libertou na semana passada mais de 3500 detidos, um número muito superior aos que saíram das cadeias antes das anteriores visitas papais. Mas a oposição diz entre eles não estava um único preso político – a amnistia excluía os condenados por crimes contra a segurança do Estado.
Os dissidentes lamentam também não terem tido resposta aos pedidos que fizeram para ser recebidos pelo Papa, sobretudo depois de o Vaticano ter dito que Francisco poderá visitar Fidel Castro se a saúde do líder histórico cubano o permitir. “Ouvimos falar muito da reaproximação [aos EUA] mas muito pouco de repressão, de justiça e liberdade”, criticou Berta Soler, dirigente das Damas de Branco, grupo de familiares de presos políticos cujos protestos continuam a ser reprimidos.
O padre Frederico Lombardi, porta-voz do Vaticano, assegura que Francisco não vai esquecer a defesa dos direitos humanos, mas diz que o fará sobretudo em privado, incluindo quando se encontrar com Raul Castro. O Papa dá assim sinais que não pretende mexer na estratégia de não confrontação que hierarquia católica cubana adoptou há décadas com o beneplácito de Roma e que, apesar das críticas da oposição, lhe permitiu tornar-se interlocutora do regime comunista.
Mas se é pouco provável que Francisco se aventure a comentar a política cubana, nos oito discursos que vai proferir em Cuba não deverá furtar-se a pedir mais liberdade, seja de expressão, seja religiosa, à semelhança do que fizeram os seus antecessores. “Se alguém espera palavras duras ou insultos, o Papa vai desapontá-los, primeiro porque é um pastor e depois porque é um político muito inteligente”, disse à AP Roberto Veiga, director da Cuba Posible, um dos grupos da sociedade civil tolerados por Havana. “Mas acho que ele nos vai surpreender”, vaticina.
Entre as prioridades da visita está a defesa de um papel mais activo para a Igreja cubana, que de perseguida passou a tolerada e ocupa agoraum lugar central na sociedade cubana, gerindo cantinas sociais, programas de apoio aos idosos ou aos mais jovens. Continua, no entanto, a não poder gerir escolas e hospitais, nem tem acesso aos meios de comunicação estatais. “Este é um momento muito complexo para Cuba e Francisco está a tentar inserir a Igreja no processo de mudança”, explicou ao Washington Post o professor de religião cubano Enrico Lopez. Admite-se que Havana poderá autorizar a abertura de uma universidade católica, mas não deverá prescindir da exclusividade nos outros graus de ensino.

Mas, como escreveu o jornal espanhol El País, “há nesta visita uma dimensão que vai além da religiosa”, sobretudo depois de Francisco ter sido impulsionador das negociações que levaram os Presidentes Barack Obama e Raul Castro a anunciar, em Dezembro, a vontade de reatar as relações diplomáticas. Reabertas as respectivas embaixadas, é agora do levantamento do embargo económico, em vigor desde 1962, que se fala. Um passo que o Presidente norte-americano defende – nesta sexta-feira Washington levantou novas restrições comerciais, incluindo o fim dos limites impostos à transferência de dinheiro para a ilha ou a possibilidade de as empresas americanas abrirem sucursais no país e contratarem cubanos – mas que só o Congresso americano pode dar.

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