VIDA CONSAGRADA “Despertai o mundo!” 2015, Ano da Vida Consagrada Por: Vida Nova
VIDA CONSAGRADA “Despertai o mundo!” 2015, Ano da Vida Consagrada
Por:
Vida Nova
O Papa
Francisco anunciou recentemente que o ano de 2015 será dedicado à Vida Consagrada.
Esta iniciativa foi pensada no contexto dos 50 anos do Concílio Vaticano II,
definido como “um sopro do Espírito”, e no 50º aniversário de publicação do
Decreto conciliar Perfectae caritatis, sobre a renovação da vida consagrada.
Vida
Nova apresenta um resumo das palavras que, espontaneamente, Papa Francisco dirigiu
à 82ª Assembléia Geral da União dos Superiores Gerais reunida em Roma. As suas
palavras esboçam a Igreja com a qual sonha Francisco.
“A Igreja cresce através do testemunho,
não do proselitismo. O testemunho que pode, realmente, atrair é aquele associado
a atitudes não habituais: generosidade, desapego, sacrifício, esquecimento de
si próprio no intuito de ajudar os outros. Eis o testemunho, o ‘martírio’, da
vida religiosa.
“Despertem o mundo! Sejam testemunhos de uma forma diferente de fazer as coisas, de agir, de viver! É possível viver neste mundo de forma diferente. É este testemunho que espero de vocês” |
Os
religiosos falam às pessoas com sua vida: ‘O que está acontecendo?’ Estas pessoas
estão me dizendo alguma coisa! Elas vão além de um horizonte mundano.
Portanto, a vida religiosa deve promover um crescimento na Igreja via atração.
Despertem
o mundo!
todas as regiões periféricas. Jesus foi a todas elas, visitou cada uma delas. Não tenham medo de se dirigir a quem quer seja |
O cumprimento do mandamento evangélico “ide por todo mundo e pregai o Evangelho a toda criatura” (Mc 16:15) pode se realizar com esta chave hermenêutica traduzida para as
Profecia,
institutos e obra apostólica
A
profecia do Reino, não é negociável. A ênfase deverá cair sobre os profetas, e
não em brincar de sê-los. Naturalmente, o demônio nos apresenta suas
tentações, e uma delas é: apenas parecer sermos profetas. Porém, não se pode
jogar com estas coisas. Eu mesmo tenho visto coisas tristes a esse respeito.
Não, os religiosos e as religiosas são homens e mulheres que iluminam o
futuro.
Às
vezes, ser profeta envolve fazer “ruído”, não sei exatamente como dizer.
Profecia faz ruído, “barulho”, algumas dizem: faz “bagunça”. Mas, na realidade,
o carisma dos religiosos é como o fermento: a profecia anuncia o espírito do
Evangelho.
Precisamos
não confundir o Instituto com a obra apostólica. O primeiro permanece; a
segundo passa. O carisma continua, é forte; a obra passa. Às vezes se confundem
o Instituto e a obra. O Instituto é criativo, busca sempre novos caminhos.
Nesse sentido, as periferias mudam também, podendo ser feita uma lista sempre
diferente.
Vocações
e carisma
Todas as
culturas são capazes de ouvir o chamado do Senhor, e que ele é livre
“Certamente iremos cometer enganos, não há
dúvida. Mas isso não deverá ser motivo para nos
fazer parar. Na verdade, deveríamos sempre
pedir perdão eolhar envergonhados para as
falhas apostólicas devido à falta de coragem”
dúvida. Mas isso não deverá ser motivo para nos
fazer parar. Na verdade, deveríamos sempre
pedir perdão eolhar envergonhados para as
falhas apostólicas devido à falta de coragem”
para suscitar mais vocações em uma parte do mundo do que em outras. O que o Senhor quer dizer ao nos enviar vocações provindas das igrejas mais jovens? Não sei. Mas me faço essa pergunta. Temos que fazê-la. O desejo do Senhor se encontra, de alguma forma, aí. Há igrejas que estão dando frutos novos. Talvez, em algum momento elas não eram tão férteis, mas agora estão sendo. É claro, necessitamos repensar a inculturação do carisma. O carisma é único, porém ele precisa – como costumava dizer Santo Inácio – ser vivido de acordo com cada lugar, tempo e indivíduo.
O
carisma não é uma garrafa de água destilada. Ele precisa ser vivido energicamente
assim como precisa ser interpretado culturalmente. Mas, nesse sentido, há o
perigo de cometer equívocos; uns dirão, o perigo de cometermos erros. É
arriscado, certamente. Certamente iremos cometer enganos, não há dúvida. Mas
isso não deverá ser motivo para nos fazer parar, porque há a chance de
cometermos enganos maiores. Na verdade, deveríamos sempre pedir perdão e olhar
envergonhados para as falhas apostólicas devido à falta de coragem. Por
exemplo, pensemos nas intuições pioneiras de Matteo Ricci.
Não
estou me referindo às adaptações folclóricas dos hábitos, dos costumes.
Trata-se de uma questão de mentalidade, de modo de pensar. Afinal, não posso
formar alguém como uma pessoa consagrada sem considerar sua vida, suas
experiências, mentalidade e contexto cultural. Este é o caminho. É isso o que
os grandes missionários fizeram. Lembro agora as aventuras extraordinárias do
jesuíta espanhol Segundo Llorente, um missionário tenaz e contemplativo no
Alaska. Ele não apenas aprendeu o idioma como também a forma concreta de pensar
daquele povo. Portanto, inculturar o carisma é fundamental, e isso não quer
dizer, de forma alguma, relativizá-la. Não podemos fazer do carisma algo rígido
ou uniforme. Quando fazemos nossas culturas uniformes, matamos nosso carisma.
A
formação
A
formação de candidatos é fundamental. Há quatro pilares da formação: o
espiritual, o intelectual, o comunitário e o apostólico. O fantasma que se deve
combater é a imagem da vida religiosa entendida como um refúgio e consolo face
a um mundo ‘externo’, difícil e complexo.
“O fantasma que se deve combater é a imagem da vida religiosa entendida como um refúgio e consolo face a um mundo ‘externo’, difícil e complexo” |
Estes quatro pilares precisam estar integrados já desde o primeiro dia em que entram para o noviciado, e não devem ser estruturados de modo sequencial. Precisam ser interativos.
A
cultura de hoje é muito mais rica e conflitiva do que aquela que vivemos em
nossos dias, décadas atrás. Nossa cultura era mais simples e ordenada.
Atualmente, a enculturação clama por uma atitude diferente. Por exemplo, não
se resolvem os problemas simplesmente proibindo de se fazer isso ou aquilo. É
necessário muito diálogo, muita confrontação. Para evitar problemas, em
algumas casas de formação os jovens ficam calados, tentam não cometer erros
evidentes, seguem as regras sorrindo, apenas esperando pelo dia em que lhes
dirão: ‘Bom, terminaste a formação.’ Isso é a hipocrisia, fruto do
clericalismo, que é um dos males mais terríveis. Precisamos vencer esta propensão
ao clericalismo em nossas casas de formação e nos seminários.
Disso,
segue-se que se o seminário for muito grande, precisa-se separá-lo em
comunidades menores com formadores que estejam capacitados a acompanhar,
verdadeiramente, aqueles de sua responsabilidade. O diálogo deve ser sério,
sem medo, sincero.
É
importante lembrar que a linguagem dos jovens em formação, hoje, é diferente
daquela do passado: estamos vivendo uma mudança epocal. A formação é uma obra
de arte, não uma ação policialesca. Devemos formar o coração dos jovens. Do
contrário, formaremos pequenos monstros. E então estes pequenos monstros
formarão o Povo de Deus. Isso me dá arrepios.
Enviados
para o povo
É
importante pensar sobre o povo para o qual estas pessoas serão enviadas durante
sua formação: Precisamos sempre pensar nos fiéis, no Povo fiel de Deus. É
necessário formar pessoas que sejam testemunhos da ressurreição de Jesus. O
formador tem que pensar que a pessoa em formação será chamada a cuidar do Povo
de Deus.
“Para evitar problemas, em algumas casas de
formação os jovens ficam calados, tentam não
cometer erros evidentes, seguem as regras
sorrindo, apenas esperando pelo dia em que lhes dirão: ‘Bom, terminaste a formação.’ Isso é a hipocrisia,ruto do clericalismo, que é um dos males mais terríveis. Precisamos vencer esta propensão
ao clericalismo em nossas casas de formação
e nos seminários”
|
É
necessário sempre pensar no Povo de Deus durante todo este processo. Pensemos
nos religiosos que têm o coração tão ácido quanto o vinagre: eles não foram
feitos para o povo. No final, não devemos formar administradores, gerentes,
mas pais, irmãos, companheiros de viagem.
Aceitar
um jovem no seminário que tenha sido pedido a deixar o instituto religioso por
causa de problemas com a formação e por razões sérias é um enorme problema.
Não falo das pessoas que se reconhecem como pecadoras: todos somos pecadores,
porém nem todos somos corruptos. Pecadores são aceitos, mas não pessoas
corruptas.
A
fraternidade
A
tentação contra a fraternidade é o que mais impede o caminho para a vida consagrada.
Às vezes, viver em fraternidade é difícil, mas se não for vivida não será produtiva.
A obra, também a ‘apostólica’, pode-se tornar uma fuga da vida fraterna. Se
alguém não consegue viver em fraternidade, não poderá viver uma vida
religiosa.
A
fraternidade religiosa, com toda a sua diversidade possível, é uma experiência
de amor que vai além dos conflitos. Conflitos comunitários são inevitáveis: de
certo modo, eles precisam ocorrer, caso a comunidade esteja verdadeiramente
vivendo relações sinceras e honestas. É a vida.
Não faz
sentido pensar em uma comunidade na qual haja irmãos que não vivenciam
dificuldades em suas vidas. Algo está faltando em comunidades onde não existam
conflitos. A realidade dita que existam conflitos em todas as famílias e grupos
humanos. E os conflitos precisam ser encarados de cabeça em pé: não deveriam
ser ignorados. Encobri-los só cria uma panela de pressão que irá, por fim,
explodir. Uma vida sem conflitos não é vida.
Jamais
deveríamos agir como o sacerdote ou o levita na parábola do bom samaritano, que
simplesmente passaram ao longe. Mas o que deveríamos fazer? Lembro-m da
história de um jovem, de 22 anos, que sofria de profunda depressão. Não estou
falando de um religioso, mas de um jovem que morava com sua mãe, a qual era
viúva e que lavava roupas para famílias ricas. Este jovem não mais foi
trabalhar e vivia ofuscado pelo álcool. A mãe não conseguia ajudá-lo: toda
manhã, antes de sair, ela simplesmente o olhava com grande ternura. Hoje este
jovem é uma pessoa importante: superou o problema, porque, no final,
“A formação é uma obra de arte, não uma ação
policialesca. Devemos formar o coração dos jovens.
Do contrário, formaremos pequenos monstros.
E então estes pequenos monstros formarão o
Povo de Deus. Isso me dá arrepios”
aquele
olhar de ternura de sua mãe o sacudiu. Precisamos recuperar esta ternura,
incluindo a ternura materna. Pensemos na ternura que São Francisco viveu, por
exemplo. A ternura ajuda a superar os conflitos. Se isso não bastar, poderá
ser o caso de trocar de comunidade.
Conflitos
comunitários
É
verdade, às vezes somos muito cruéis. Todos vivemos a sensação de criticar
visando satisfação pessoal ou obter vantagens. Por vezes, os problemas na
fraternidade devem-se a personalidades frágeis, casos nos quais a ajuda de um
profissional, um psicólogo, deveria ser procurada. Não há porque ter medo
disto: não se precisa temer cair, necessariamente, no psicologismo. Mas nunca,
nunca deveríamos agir como administradores ante o conflito de um irmão. Temos
que envolver o coração.
A
fraternidade é algo delicado. Precisamos cuidar dos conflitos. Lembro-me de
quando Paulo VI recebeu a carta de uma criança com muitos desenhos. Ele disse
que o fez muito bem ter recebido uma carta dessas sobre uma mesa repleta de
tantas outras que só falavam de problemas. A ternura nos faz bem. A ternura
eucarística não mascara os conflitos, mas ajuda-nos a enfrentá-los como homens.
Relações
entre
religiosos
e bispos
Os
carismas dos vários institutos precisam ser respeitados e fomentados porque
são necessários nas dioceses. Conheço por experiência os problemas que podem
haver entre um bispo e as comunidades religiosas. Por exemplo, se os religiosos
decidem um dia deixar uma de suas obras devido à falta de religiosos, o bispo
logo se encontra com uma batata quente nas mãos. Eu mesmo passei por experiências
difíceis como esta. Se me informavam que uma obra estava sendo abandonada, eu
não sabia o que fazer. Na verdade, uma vez me contaram isso só após, quando já
havia ocorrido. Inversamente, posso também falar de outros episódios muito
positivos.
O fato é
que conheço os problemas, mas também sei que os bispos nem sempre estão por
dentro dos carismas e das obras dos religiosos. Nós, bispos, precisamos
entender que as pessoas consagradas não são funcionárias, e sim presentes que
enriquecem as dioceses.
“Pensemos nos religiosos que têm o coração tão
ácido quanto o vinagre: eles não foram feitos para
o povo. No final, não devemos formar
administradores, gerentes, mas pais, irmãos,
companheiros de viagem
O
envolvimento das comunidades religiosas nas é importante. O diálogo
entre o bispo e os religiosos tem que ser resgatado, de modo que, devido à
falta de entendimento de seus carismas, os bispos não vejam os religiosos
simplesmente como instrumentos úteis.
As
fronteiras da missão: marginalização e educação
As
fronteiras temos que buscá-las na base do carisma de cada Instituto. Portanto,
precisamos fazer o discernimento segundo cada carisma em particular. Por certo,
as realidades de exclusão se apresentam como as prioridades mais significativas,
mas elas necessitam de discernimento.
O
primeiro critério é mandar as pessoas mais talentosas a estas situações de
exclusão e marginalização. Estas são as situações mais arriscadas e que
precisam de coragem e uma grande dose de oração. Além disso, é necessário que
os Superiores apóiem e encorajem as pessoas dedicadas a esta obra.
Sempre
há o risco de se deixar levar pelo entusiasmo; isso pode resultar no envio de
religiosos que tenham boa vontade, mas que não estejam preparados para as
situações que encontrarão nas fronteiras dos marginalizados às quais forem
enviados. Não devemos tomar decisões quanto aos marginalizados sem estarmos
certos do discernimento adequado e do apoio.
Os
pilares da educação são: transmitir conhecimento, transmitir modos de fazer as
coisas, transmitir valores. Através destes transmite-se a fé. O educador, ou
educadora, deve estar à altura das pessoas que educa; ele ou ela precisa se
interrogar sobre a forma como anunciar Jesus Cristo a uma geração em constante
mudança. A educação, hoje, é a missão central, central, central!
Última
palavra aos superiores maiores
Obrigado.
Obrigado pelo que vocês fazem, pelo espírito de fé e pela busca do serviço.
Obrigado pelo seu
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