JAPÃO JAPÃO, PAÍS DE MÁRTIRES por Adelino Ascenso


JAPÃO
JAPÃO, PAÍS DE MÁRTIRES por Adelino Ascenso 

O cristianismo foi introduzido no Japão com a chegada àquele país de Francisco Xavier (1506-1552) em 1549 e gozou de grande expansão durante a segunda metade do século XVI. No entanto, devido ao desenvolvimento de fricções e tensões entre o cristianismo e o mundo cultural e religioso japonês, ao que não estarão alheias dificuldades de cariz político, o cristianismo começou a ser perseguido.
As perseguições tiveram o seu início em 1587, com a publicação do primeiro decreto de Hideyoshi Toyotomi (1536-1598) expulsando os jesuítas das terras nipónicas, embora a proibição tenha ficado praticamente só no papel, não sendo rigorosamente acatada pelos missionários nem estritamente aplicada pelas autoridades japonesas, se bem que exi-
gisse mais discrição. As coisas adquiriram gravidade no outono de 1596 com os escombros do navio San Felipe, um galeão espanhol que vinha de Manila e que seguia para Acapulco. Hideyoshi ordenou o confisco da carga do navio. Não se sabe ao certo as razões pelas quais Hideyoshi teve uma reacção severa, embora a vinda do capitão a exigir a devolução da carga reivindicando soberania espanhola global certamente terá contribuído para isso. O certo é que Hideyoshi decidiu dar uma lição. Vinte e seis cristãos foram presos, levados para Nagasaki e crucificados a 6 de fevereiro de 1597: são os 26 mártires de Nagasaki – S. Paulo Miki e companheiros –, cuja memória se celebra a 6 de fevereiro.
Apesar de tudo, durante a primeira década do século XVII parecia que a presença do cristianismo e dos seus padres era tolerada, mas o ponto de viragem chegou com o decreto de proscrição do cristianismo e expulsão de todos os missionários em 1614. De entre os estrangeiros deportados, havia alguns proeminentes japoneses, como é o caso de Justo Takayama Ukon (1553-1615), que foi para Manila, onde morreria pouco depois e viria a ser beatificado em Osaka a 7 de fevereiro de 2017.
Diz-se que ao longo dos dez anos que se seguiram, foram mortos, em média, cerca de cinquenta cristãos por ano, decapitados ou crucificados, e a perseguição para forçar à apostasia continuou com grande rigor, calculando-se que entre 1627 e 1636 terão sido martirizados 5000 a 6000 cristãos. Apesar das duras perseguições, pequenas comunidades dos arredores de Nagasaki e ilhas Gōtō conseguiram sobreviver e transmitir a tradição cristã ao longo de muitas gerações, até ao dia do seu encontro com os missionários franceses em Nagasaki (1865), aquando da segunda introdução do cristianismo no Japão. Dois séculos e meio sem sacerdotes, à excepção de alguns escondidos durante as primeiras décadas do século XVII. As comunidades dependiam dos líderes leigos.
Foi a um solo com tais alicerces que a SMBN chegou a 10 de março de 1998, 449 anos depois de Francisco Xavier e 400 anos após a chegada a Nagasaki do grande bispo Luís Cerqueira, SJ (1552-1614). Cerqueira era natural de Alvito, Évora, e viria a ser o quinto bispo da Diocese de Funai (fundada em 1588) e o seu primeiro bispo a residir no país (em Nagasaki, uma vez que só aí os cristãos gozavam de alguma liberdade), onde permaneceria até à sua morte, em 1614, deixando marcas indeléveis na Igreja nipónica: fundou o denominado Seminário de Clérigos em 1601, para a formação de clero local, com oito alunos: seis japoneses e dois portugueses, alunos esses que foram escolhidos de entre os melhores do Seminário jesuíta. O primeiro sacerdote diocesano (ordenado em 1604) foi o P. António Miguel, filho de pai português e mãe japonesa.
Completam-se duas décadas da presença da SMBN na Arquidiocese de Osaka, o que é alento para reflectirmos sobre o que nos levou a rasgarmos horizontes asiáticos e o sentido que pode ter para a SMBN esta presença naquele país de mártires, onde as raízes portuguesas foram tão robustas.
Votos de Santa Páscoa.
P. Adelino Ascenso
Superior Geral da smbn
In BF 403

Comentários

Mensagens populares