EUTANÁSIA Papa Francisco defende a dignidade humana por Armando Soares


EUTANÁSIA
Papa Francisco defende a dignidade humana   por Armando Soares

Assistimos ao debate e votação da Eutanásia na Assembleia da República, no dia 29 de maio 2018. Foi chumbada por cinco votos.
Projeto do PS foi o que esteve mais perto de passar, com 110 votos a favor, 115 contra, e 4 abstenções. Deputados do PSD dispersaram votos e dois deputados do PS votaram contra. A votação foi uma surpresa e o debate decorreu com respeito mas em confusão de ideias quanto a ‘dignidade humana’ e ‘humanidade e seus valores’, além de ‘direitos do homem’.
O CDS alegrou-se com a votação. Retemos as palavras de PCP: "A dignidade da vida não depende da consagração legal do direito à antecipação da morte". CDS: "Não impomos nada a ninguém, vocês é que vão impor ao SNS". Bacelar Vasconcelos: "O único sentido da vida humana é aquele que cada um de nós, em consciência, lhe quiser atribuir”. Assunção Cristas aplaudiu os discursos em frente ao Parlamento. E ouviram-se protestos: “As pessoas não querem que o Estado nos mate”. “Vida sim, morte não”.
A despenalização da eutanásia: “uma questão superior à consciência individual dos deputados”, defendeu a fundadora do movimento Stop Eutanásia. “Evidentemente que estou muito, muito contente com a noção de missão cumprida; e também por ver que este parlamento ponderou, pensou, não se precipitou e acho que foi um grande sinal da democracia”, disse Sofia Guedes à Lusa.

Todo este debate me fez reviver o discurso do Papa Francisco, em novembro de 2014, na União Europeia, em Estrasburgo, em que falou aos   parlamentares sobre a ‘dignidade humana transcendente’.
Os Pais fundadores da União Europeia, desejavam trabalhar juntos para superar as divisões e promover a paz e a comunhão. No centro deste ambicioso projeto político, estava a confiança no homem, não tanto como cidadão ou como sujeito económico, mas no homem como pessoa dotada de uma ‘dignidade transcendente’, disse.
«Dignidade» é a palavra-chave que caracterizou a recuperação após a Segunda Guerra Mundial. A nossa história recente caracteriza-se pela inegável centralidade da promoção da dignidade humana contra as múltiplas violências e discriminações que não faltaram, ao longo dos séculos. A perceção da importância dos direitos humanos nasce precisamente como resultado de um longo caminho que contribuiu para formar a consciência da preciosidade, unicidade e irrepetibilidade de cada pessoa humana. Esta tomada de consciência cultural tem o seu fundamento sobretudo no pensamento europeu, caracterizado por um rico encontro cujas numerosas e distantes fontes provêm «da Grécia e de Roma, de substratos celtas, germânicos e eslavos, e do cristianismo que os plasmou profundamente», dando origem precisamente ao conceito de «pessoa».
À par de uma certa relacionalidade dos seres humanos, estes também são  «tratados como objetos, dos quais se pode programar a conceção, a configuração e a utilidade, podendo depois ser jogados fora quando já não servem porque se tornaram frágeis, doentes ou velhos», reflete.
Promover a dignidade da pessoa significa reconhecer que ela possui ‘direitos inalienáveis’, de que não pode ser privada por arbítrio de ninguém e, muito menos, para benefício de interesses económicos. Não produz ou dá despesas, elimina-se. Este é um abuso paradoxal dos direitos humanos, numa reivindicação crescente dos direitos individuais,  diz o Papa Francisco.
Falar da ‘dignidade transcendente’ do homem significa apelar para a sua natureza, significa olhar para o homem, não como um absoluto, mas como um ser relacional. Uma das doenças que, hoje, vejo mais difusa na Europa é a solidão. Vemo-la particularmente nos idosos, muitas vezes abandonados à sua sorte,… nas nossas cidades
.
A Europa está cansada e envelhecida e dominada pelo tecnicismo burocrático das suas instituições e por alguns estilos de vida egoístas, caracterizados por uma opulência indiferente ao mundo circundante dos mais pobres. No centro do debate político, constata-se lamentavelmente a preponderância das questões técnicas e económicas em detrimento de uma autêntica orientação antropológica .
“O ser humano corre o risco de ser reduzido a mera engrenagem dum mecanismo que o trata como se fosse um bem de consumo a ser utilizado, de modo que, quando deixa de ser funcional para esse mecanismo, é descartada sem muitas delongas, como no caso dos doentes terminais, dos idosos abandonados e sem cuidados, ou das crianças mortas antes de nascer.”

O futuro da Europa depende da redescoberta do nexo vital e inseparável entre dois elementos: como Platão, olhar para o alto, para o mundo das ideias, para o céu e, como Aristóteles, estender a mão para a realidade concreta. A Europa fez-se do encontro permanente entre céu e terra, entre a abertura ao transcendente, a Deus, que desde sempre caracterizou o homem europeu, e a terra que representa a sua capacidade concreta de enfrentar as situações e os problemas.
Uma Europa incapaz de se abrir à dimensão transcendente da vida é uma Europa que lentamente corre o risco de perder a sua própria alma e o «espírito humanista» que naturalmente ama e defende. Dar esperança à Europa significa investir na educação, na família, célula fundamental e elemento precioso de toda a sociedade. A família unida, fecunda e indissolúvel traz consigo os elementos fundamentais para dar esperança ao futuro.(…) Sublinho a importância da família para dar perspetivas  e esperança a muitos idosos, frequentemente constrangidos a viver em condições de solidão e abandono, porque já não há o calor dum lar doméstico capaz de os acompanhar e apoiar.

E termina seu discurso com um apelo: “Queridos Eurodeputados, chegou a hora de construir juntos a Europa que gira, não em torno da economia, mas da sacralidade da pessoa humana, dos valores inalienáveis; a Europa que abraça com coragem o seu passado e olha com confiança o seu futuro, para viver plenamente e com esperança o seu presente. Chegou o momento de abandonar a ideia de uma Europa temerosa e fechada sobre si mesma para suscitar e promover a Europa protagonista, portadora de ciência, de arte, de música, de valores humanos e também de fé. A Europa que contempla o céu e persegue ideais; a Europa que assiste, defende e tutela o homem; a Europa que caminha na terra segura e firme, precioso ponto de referência para toda a humanidade!
Somos pela dignidade da pessoa humana como ser transcendente.

Comentários

Mensagens populares