Ir mais além! por ARMANDO SOARES
Ir mais além! por ARMANDO SOARES
Paulo e Barnabé, depois do anúncio do Evangelho aos pagãos da Ásia Menor, regressaram a Antioquia da Síria. O insucesso com os judeus levou-os a inclinarem-se sempre cada vez mais a trabalharem com os pagãos. A recusa dos judeus a quem se dirigiam em primeiro lugar, levou-os a voltarem-se para os gentios. Ao chegarem a Antioquia, donde tinham partido, Paulo e Barnabé contam à Igreja, à comunidade reunida, o que Deus fizera por meio deles e "como abrira aos pagãos a porta da fé".
Depois
de muita confusão e controvérsia sobre a obrigação de impor a Lei Moisaica aos
cristãos de origem pagã, subiram a Jerusalém onde se reuniram os Apóstolos e os
anciãos para examinarem a questão. E Pedro lembrou que "os pagãos recebiam
o Espírito Santo e o dom da fé, testemunhando assim Deus a favor deles". E
Tiago disse que "não se devem importunar os pagãos convertidos a
Deus".
A
carta que foi enviada de Jerusalém, foi lida em Antioquia perante a assembleia
reunida. "Depois de a lerem, todos ficaram satisfeitos com o encorajamento
que lhes trazia". E "Judas e Silas, os delegados enviados com Paulo e
Barnabé, exortaram e fortaleceram os irmãos". E Paulo e Silas recomeçaram
a caminhada "fortalecendo as Igrejas".
Mas o
Espírito de Jesus "impediu-os de anunciarem a Palavra na Ásia" e
"não lhes permitiu irem para a Bitínia". Em Tróade, durante a noite,
Paulo teve uma visão: "Um macedónio estava de pé diante dele e fazia-lhe
este pedido: "Passa à Macedónia e vem ajudar-nos". E,
"procurámos partir para a Macedónia, persuadidos de que Deus nos chamava
para aí anunciarmos a Boa Nova". E assim prosseguiu a segunda viagem
missionária de Paulo.
Hoje,
como ontem, em muitos lados e de muitos modos o apelo do macedónio repete-se:
"vem ajudar-nos". Da África sedenta de paz e faminta de pão, de
justiça, de respeito pela vida que a guerra destruíu e destrói. Da América do
Sul, que luta pelos direitos dos índios em fase de exterminação violenta, e
duma Amazónia - pulmão do mundo - destruída pela voracidade dos interesses das
multinacionais. Das grandes cidades onde a miséria social e moral clamam por
mais atenção. Dos jovens que se sentem desamparados e vazios numa sociedade de
consumo cujo "bem estar" é pautado pelo materialismo. Das regiões
onde o racismo destrói os grupos adversários sem dó nem piedade extravasando
vinganças e ódios.
De
dentro da própria Igreja onde muitas vezes as pessoas são tratadas como
objectos com nítida falta de respeito pela sua personalidade e pelas suas
capacidades amordaçadas por estruturas anquilosadas ou mentalidades
retrógradas. Das próprias comunidades religiosas ou apostólicas onde impera a
vingança, a má vontade, o desrespeito pela idade, pela saúde, pelo valor, pela
capacidade dos membros, para alguns satisfazerem caprichos obsoletos ou raivas
acumuladas pelo passar dos anos, e que acabam por destruir a comunidade e os
que tramam essas artimanhas porque o peso da consciência não os deixará
tranquilos a não ser que já não a tenham. Das famílias onde não reina o amor, e
a paz foi de férias, onde os pais estão desavindos por intermináveis silêncios
ou silêncios demasiado prolongados. Destes e de muitos outros lados, de longe e
bem de perto, nos gritam: "vem ajudar-nos".
O
cristão é chamado a "ir mais longe", a tornar presente a mensagem do
Evangelho pelo testemunho da sua vida pois "escutamos
mais as testemunhas que os mestres, ou ainda melhor, escutamos mais os mestres
que são testemunhas".
Proclamar
a mensagem da vida, do amor, da paz e da unidade, sem medo, "à luz do
dia", e "sobre os telhados", é tarefa de todo o cristão. Com o
testemunho e não com palavreado ou com pretensas capacidades comunicativas que
não passam de meras comezainas e copos e que deixam as pessoas mergulhadas na
tortura do vazio. Conviver é bom, é necessário, é útil, é evangélico, mas tem
suas regras para não incomodar e nunca passar a ambiente frívolo e destruidor
de rom-rom interminável e desinquietador.
Como dizia, há poucos dias, D. José Policarpo, e eu concordo plenamente com
ele, "as atribulações da Igreja brotam, hoje, das dificuldades inerentes
ao seu crescimento interno e à realização da sua missão". No dia em que
formos o testemunho vivo da verdadeira fraternidade, a Igreja se renovará em
vida cristã séria e em abundância de vocações. A vida do Padre-testemunho, do
Padre-oração, do Padre-vida, do Padre-santo, do Padre-simples, como o Cura d'
Ars, será fermento na massa. Esse tempo virá quando nós Padres quisermos e se
quisermos.
Acarinhar,
estimular, confirmar na fé, visitar, fortalecer as Igrejas e comunidades,
anunciar a Palavra de Deus cumprida, entregar-se à alegria da fé em Deus,
encorajar, exortar com paciência e humildade, nunca criar divisões, segundo a
1ª Carta de Paulo aos Coríntios,... é linguagem de uma comunidade a crescer
interna e externamente. Mas infelizmente esta linguagem não é hoje entendida
por muitos responsáveis de sectores da Igreja. "Ir mais além", é
palavra de ordem que compromete a todos os que são animados pelo Espírito de
Deus e não se limitam a fazer como é costume, ou a dizer mal de outros, até
porque é mais fácil desfazer do que fazer, ou então a esperar cobardemente
pelas pessoas e pelo tempo. Estimular é palavra de ordem para "ir mais
além"!
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