DEUS “Deus morreu “ e “agora”? por Anselmo Borges, in DN
DEUS
“Deus morreu “ e “agora”? por Anselmo Borges, in DN
11 julho 2015
….. a morte de Deus sonhada numa paisagem
apavorante... túmulos abertos…num universo abalado… com sombras de mortos. Então
surge Cristo, figura nobre, e arrasada por uma dor sem nome parecendo aguardar a ressurreição E.., com um
terrível pressentimento, "os mortos todos gritam-lhe: "Cristo, não há
Deus?" Ele respondeu: "Não, não há Deus." E a sombra de cada
morto estremeceu. E Cristo continuou, anunciando o que aconteceu no instante da
sua própria morte: "Atravessei os mundos, … , e não há Deus. Desci até
onde o ser estende as suas sombras, e olhei para o abismo, gritando: "Pai,
onde estás?" Mas apenas ouvi a tormenta eterna, que ninguém governa."
O coração rebentou de dor, quando as crianças sepultadas no cemitério se
lançaram para Cristo, perguntando: "Jesus, não temos Pai?" E ele,
debulhado em lágrimas, respondeu: "Somos todos órfãos, eu e vós, não temos
Pai." Para Jean Paul, a morte de Deus não era a tentação de uma
possibilidade ameaçadora. Quando acordou do pesadelo ateu, a sua alma
"chorava de alegria, por poder de novo adorar a Deus - e a alegria e o
choro e a fé nele era a oração".
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Um século depois (1882), Nietzsche proclamou a morte de Deus: "Quem o
matou fomos todos nós, vós mesmos e eu!" "Nunca existiu acto mais
grandioso." Ao mesmo tempo, Nietzsche tem consciência aguda do que se
segue: "Para onde vamos nós, agora? Não andaremos errantes através de um
nada infinito? Não estará a ser noite para todo o sempre, e cada vez mais
noite?"
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O filósofo Gilles Lipovetsky escreveu, em A Era do Vazio: "Deus morreu, as
grandes finalidades extinguem-se, mas toda a gente se está a lixar para isso. O
vazio do sentido, a derrocada dos ideais não levaram, como se poderia esperar,
a mais angústia, a mais absurdo, a mais pessimismo." Mas Leszek
Kolakowski, o filósofo agnóstico, disse que o nosso "é um mundo privado de
todo o sentido, de qualquer orientação, sinal de direcção, estrutura", de
tal modo que, desde a proclamação da morte de Deus por Nietzsche,
"praticamente nunca mais vimos ateus serenos": "A ausência de
Deus tornou-se a ferida sempre aberta do espírito europeu, por maior que tenha
sido o esforço para esquecê-lo, recorrendo a toda a espécie de narcótico."
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Há quem acuse a fé de mera ilusão. Mas eu creio que ela é sobretudo um combate,
como reza esta espécie de testamento de um judeu que morreu em 1943 no gueto de
Varsóvia: "Creio no Deus de Israel, embora ele tenha feito todo o possível
para que não acredite... Deus ocultou o seu rosto ao mundo. As folhas que
escrevo vou encerrá-las nesta garrafa vazia e escondê-la entre os tijolos da
parede, debaixo da janela. Se alguém as encontrar um dia e as ler, talvez
entenda o sentimento de um judeu - um entre milhões - que morreu como
abandonado de Deus, esse Deus no qual acredita tão firmemente." (Resumido por Armando Soares)
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