POEMA As minhas mãos* por João Guerra


POEMA
As minhas mãos* por João Guerra

As minhas mãos prendem o mundo.
Por elas passam e repassam todos os laços
e agarro o voo das aves que prolongam as árvores
e abençoo os arroubos dos ímpetos celestes
e abraço as crianças com a fita da doçura.
Que encanto me invade em ondas de formosura e espanto!
A espantosa realidade de ser criança!

As minhas mãos fundam o mundo.
Por elas existem as formas multiformes
das rosas e dos cravos
dos veios das cidades e dos perfis dos monumentos.
Por elas nascem as casas dos afectos
em colunas robustas de tactos e contactos.
Por elas se fazem e desfazem os fios
que tecem e entretecem as curvas da vida e
as abelhas voam em rodopios de flor em flor.

As minhas mãos são montras de vida e de morte
espelho silencioso e paciente.
Nelas vejo-me a mim e de mim fujo.
Livro aberto onde escrevo todos os dias
os socalcos da fluente e feliz existência
e os jardins abrem-se em cachos como o sol.

As minhas mãos andam comigo fiéis companheiras.
Falam comigo de convites reais e virtuais.
Cimentam a vontade de não estar a percorrer:
Não vás por aí: andam lobos à solta.
 Vem por aqui: é a estrada maternal da vida.
Assim passo em diálogo permanente esta vida
que alguém me deu e me abraçou no fogo da gratidão
* in BOA NOVA julho 2017


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