RUANDA/genocídio
“FILHAS INDESEJADAS”: são fruto de
violação, são as filhas “indesejadas” do genocídio
07.abril 2019 in P
Vinte e cinco anos após o genocídio no Ruanda, o fotolivro Rwandan Daughters
revela os rostos de 80 mães violadas, 80 filhas “indesejadas” e, implicitamente,
o espectro de 160 corações partidos em busca de aceitação. “O estigma ainda está
demasiado presente”, diz o fotógrafo Olaf Heine.
Por Ana Marques Maia
Durante o genocídio no Ruanda,
entre 7 de Abril e 4 de Julho de 1994, cerca de 800 mil pessoas terão
morrido às mãos da maioria hutu, segundo cálculos das Nações
Unidas; no mesmo período, entre 150 a 250 mil mulheres terão
sido vítimas de violação. Fruto desses ataques sexuais contra a minoria
tutsi nasceram crianças “indesejadas”, que foram aceites relutantemente pelas
suas mães, e que são encaradas pela sociedade ruandesa não como vítimas,
mas como “filhas de assassinos”. Duas gerações de mulheres unidas pelo trauma
dialogam entre si nos difíceis retratos que o alemão Olaf Heinerealizou ao longo de dois anos,
por todo o território do Ruanda. O fotolivro Rwandan Daughters,
lançado a 5 de Abril pela editora Hatj
Cantz, 25 anos depois do massacre, revela os rostos de 80 mães, 80
filhas e, implicitamente, o espectro de 160 corações partidos em busca de aceitação.
Em entrevista ao P3, o
fotógrafo alemão, que desenvolveu o projecto ao longo de três anos — entre 2016
e 2018 —, admite ter perdido a ingenuidade à medida que foi conhecendo
mais mulheres no terreno. “Eu já tinha lido bastante sobre a violação como arma
de guerra, mas só no local, após o contacto com estas mulheres, compreendi o
que realmente acontece e a extensão dos danos”, explica. “Estas mulheres foram sequestradas
durante semanas, violadas diariamente por muitos homens, grupos de homens. É
inconcebível pensar que há pessoas capazes de fazer isto a outras pessoas.”
Olaf viu “muitas lágrimas”, mas verificou que todas as mulheres que retratou
sentiam necessidade de partilhar a sua história. “Para elas, os retratos
funcionaram quase como uma forma de terapia”. Ainda assim, o fotolivro não será
lançado no Ruanda por haver necessidade de salvaguardar a identidade destas
mulheres. “O estigma ainda está demasiado presente”, justifica.
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